“Eu faço novas todas as coisas”

Eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e às orações. Perante os inumeráveis prodígios e milagres realizados pelos Apóstolos, o temor dominava todos os espíritos. Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum. Vendiam terras e outros bens e distribuíam o dinheiro por todos, de acordo com as necessidades de cada um. Como se tivessem uma só alma, frequentavam diariamente o templo, partiam o pão em suas casas e tomavam o alimento com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e tinham a simpatia de todo o povo. E o Senhor aumentava, todos os dias, o número dos que tinham entrado no caminho da salvação.
Actos dos Apóstolos, 2, 42-47
Depois de tantos anos de catequese, grupos e afins, temos mesmo de ser capazes de “fazer novas todas as coisas”, é que há leituras que já lemos muitas vezes e podemos cair no erro de pensar: “esta leitura? Não! já a li, não me interessa, não a percebo ou já a sei de cor”.
Sempre gostei desta leitura, mas acho que cada vez mais a sinto como uma utopia, um sonho impossível de alcançar, cada vez estamos mais longe destas primeiras comunidades. Quando saí de casa dos meus pais tentei fazer uma comunidade que tivesse esta ideia como fundo. Mas não consegui, não encontrei quem partilhasse das minhas ideias e necessidades. 
Neste momento vivo com o meu marido e filhos. Gostava de viver numa “qualquer” comunidade com os meus vizinhos do lado, da frente… Mas estamos longe disso. Por vezes até a nossa família alargada: pais, irmãos, avós, tios não fazem parte da nossa comunidade. 
Actualmente parece que não tenho tempo nem para o essencial. Não tenho tempo para falar com o meu filho mais velho e só trabalho até às 17h! Como vou ter tempo para partilhar com a minha comunidade? Um dos bens mais preciosos que temos é o nosso tempo. Como estamos a organiza-lo? Quanto tempo despendemos a dormir, a trabalhar, a fazer desporto, a conversar com quem mais gostamos, a conversar com Deus, a ver televisão, quanto tempo despendemos com a nossa comunidade, com quem mais precisa de nós?
Quando estava na faculdade uma vez estava a fazer um trabalho de grupo e fizemos uma directa para adiantar o trabalho (estávamos a stressar que não o íamos acabar a tempo) mas no domingo à tarde um dos colegas propôs: vamos à missa? Podia parecer beato, no meio do stress do trabalho falar de ir à missa. Até podia parecer irresponsável. Mas eu achei óptimo! E lembro-me muitas vezes da sua atitude. Por vezes é difícil sermos assíduos “à união fraterna, à fracção do pão e às orações”. É preciso percebermos que essa assiduidade nos dá maior alegria, maior energia, maior bem estar.
Há uns tempos tentei falar com o Padre que dá religião e moral ao meu filho mais velho.O seu horário de “atendimento” era muito apertado, então propus falarmos naquele próprio dia depois da missa. Ficou reticente… Não era o procedimento habitual, mas poderia ser… Fiquei sem vontade de falar. Quando vamos à missa além de estarmos com deus vamos para estar em comunidade, senão podíamos ficar em casa a rezar sozinhos. Quando o proprio
celebrante não está muito disponível para falar com a sua comunidade, torna-se complicado. Confesso que acabei por não falar com ele! Tenho que me organizar para ir lá no seu horário de “atendimento”: 4ª e 6ª feira das 17h às 17h45!
“Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum. Vendiam terras e outros bens e distribuíam o dinheiro por todos, de acordo com as necessidades de cada um.” 
Será que conseguimos fazer isto? Ou achamos sempre que ganhamos pouco? Que o nosso chefe nos devia aumentar e que há tanta coisa que não conseguimos ter e fazer porque não temos dinheiro? Seremos capazes de dar de forma livre, sem pedir nada em troca? Os nossos próprios pais dão-nos tanto, e nós que fazemos por eles? As missionárias dão-nos tanto e nós lembramo-nos de pelo menos perguntar o que elas precisam? Vamos organizar o nosso tempo, vamos por-nos à disposição da nossa comunidade? Vamos viver tendo em atenção as necessidades de cada um? Façamos nova a ideia das primeiras comunidade. Vamos tentar adapta-la aos nossos dias, à nossa vida.

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